sexta-feira, 13 de maio de 2011

O TERCEIRO CÍRCULO DE ESTUDOS DO MEDUC NA HISTÓRIA DO MEMORIAL



Chegando a Santana do Acaraú em 2003 para exercer a função de Pároco cooperador, Padre Agnaldo Temóteo da Silveira buscou conhecer a história da cidade como parte do programa de uma evangelização fecunda que nela exerceu.
Sua primeira fonte foi a grande guardiã da memória santanense: Rosa Eronides Pereira (Rosa Ramiro, ainda viva em quantidade e qualidade de anos). Como filho, embora não fosse santanense, recebeu a transmissão de memórias de incontáveis anos da história religiosa.
Foi por ela que soube que Santana dispunha de uma fonte escrita acerca de sua história: uma coleção de folhetins intitulada por seus autores de ‘O Município de Santana’, publicada em Jornal de mesmo nome em 1884 e compilados em um livro por Dom José em 1926 como sinal de gratidão ao povo Santanense por ter permitido vender o prelo do referido jornal à Diocese.
Lendo-o Padre Agnaldo surpreendeu-se ao descobrir que Santana, diferente de outras cidades, nasceu unicamente da devoção de um povo a Santa Ana, cuja capela fora erigida em 1739 pelo Padre Escrivão do Curato da Caiçara Antônio dos Santos da Silveira para cumprir uma promessa de gratidão que Frei Cristóvão de Lisboa (o primeiro a estudar plantas e animais do Brasil) fizera à santa em terras que hoje pertencem ao município por nelas ter escapado da perseguição que lhe fizeram índios Tapuia.
Nesta leitura descobriu que Santana fora uma das poucas cidades da Zona Norte do Ceará a receber uma missão do Padre Ibiapina que, aqui construiu, no dizer de Antônio Bezerra, uma das suas melhores Casas de Caridade, que pouco a pouco foi sumindo para dar lugar a residências modernas.
Através da referida leitura passeou com o autor pelas ruas nos idos de 1884 e constatou algo triste: do patrimônio arquitetônico que Santana possuíra muito já se perdera e o que restava, excetuando-se o que pertencia à Paróquia, estava correndo sério risco de se perder pelo desinteresse da maioria de seus donos em restaurar tal patrimônio.
Foi ainda com Dona Rosa Eronides que soube que Padre Antônio Tomaz, o príncipe do dos poetas cearenses, estava sepultado na Igreja Matriz da cidade, terra que escolhera como pátria embora fosse da cidade de Acaraú.
Ainda por esta, pelo senhor João Batista do Espírito Santo, Francisco Evangelista Chaves (Chico pequeno) e outros tantos guardiões da memória, soube que Santana realizara, em 1948, uma das maiores festas religiosas da Diocese para comemorar os cem anos de criação da Paróquia.
Durante a reforma do sobrado padre Arakén em 2004, padre Agnaldo conheceu Audifax Rios, artista plástico e escritor de renome nacional e internacional, filho de Santana do Acaraú, que protestava contra certos itens do projeto de reforma do sobrado em um panfleto que distribuíra na cidade.
O panfleto que incomodara a muitos, chamou a atenção de padre Agnaldo para a importância de preservar os traços originais da fachada do edifício histórico, uma vez que a necessidade que os padres possuíam de uma casa paroquial modificaria seu interior.
Para tanto, buscou saber de Dona Rosa Eronides, como era a fachada original do edifício. A descrição dada pela memorialista e uma pesquisa de fotos antigas do edifício levou o intento do padre a bom termo. Os traços das janelas e portas foram mantidos, a frase inscrita na platibanda do sobrado (Deus sobre todos) veio à tona com a restauração, o alicerce foi reforçado e os canos para o escoamento das águas pluviais voltaram à forma original tendo nas extremidades externas o formato de cabeças de jacaré.
O conhecimento destes fatos da história de Santana levou o Padre a ter uma preocupação: as gerações mais novas de santanenses desconheciam sua história e sua identidade. Isto lhe pareceu algo grave, pois um povo que desconhece sua identidade tem uma baixa estima de si, desconhece suas potencialidades e enxerga em seu caminho poucas perspectivas.
Falecendo o Pároco emérito Francisco José Aragão e Silva (Antecessor de padre José Valter da Costa e Padre Agnaldo, que morava na casa paroquial em virtude de seu frágil estado de saúde) no dia 12 de Junho de 2004, os padres em exercício transferiram-se para a Casa Paroquial, ficando o sobrado com espaços que seriam utilizados por Padre Agnaldo para um audacioso projeto que se destinaria a oferecer meios para que os santanenses conhecessem um pouco de sua história e iniciassem um caminho de redescoberta de sua identidade.
Um estímulo a este intento lhe foi dado através do Encontro de Memórias realizado pelo MEDUC (Grupo de História e Memória da Educação da Universidade Estadual Vale do Acaraú) em 2006. Para este enviou, como representante da Paróquia, Francisco Leandro Costa, Professor que à época pesquisava sobre índios na história do município e que com Padre Agnaldo comungava já na época, da preocupação com a preservação da Memória e história da cidade.
O Encontro de Memórias, cuja metodologia fora a de uma grande roda para se contar memórias e acordar compromissos em comum para a preservação dos patrimônios santanenses, teve como um de seus frutos o agendamento de outra reunião naquele mesmo ano para se estudar um projeto de lei de tombamento dos patrimônios da cidade a ser analisado e submetido à votação na Câmara de Vereadores.
Na segunda reunião, que contou com a presença de Padre Agnaldo, foi lida pelo professor Francisco Guedes uma Carta aberta aos santanenses e analisada a proposta de lei do Patrimônio. A carta, considerada de teor muito enérgico por um bom número dos participantes daquela reunião, foi pouco divulgada em Santana pela repercussão negativa que muitos julgavam que ele teria. A proposta da lei parou em um fato levantado pela presidente da Câmara na época, a vereadora Sandra Maria Farias: a proposta precisava ser analisada por especialistas no assunto ou por um advogado que já tivesse experiência na elaboração de tais projetos.
Desta reunião ficou a proposta vaga de ser realizar novas rodas de conversa sobre memórias da cidade a serem agendadas por alguém que se dispusesse a articular tais encontros na cidade. Estes, aos moldes do primeiro, não foram realizados.
O que aparentemente fora um insucesso levou Padre Agnaldo a estabelecer para a Paróquia duas metas que seriam uma resposta à reflexão que moveu da inércia, algumas das consciências que participaram do Encontro de Memórias promovido pelo MEDUC: a reforma e restauração da Igreja Matriz e a criação do Memorial da Paróquia de Nossa Senhora Sant’Ana.
As duas metas foram sendo realizadas simultaneamente. Certas pesquisas fotográficas para o Memorial favoreceram a restauração da Igreja. A reforma e a restauração da Igreja transferiram muitas peças ao acervo do Memorial.
A reforma da Igreja Matriz devolveu à mesma as primeiras cores que tinha quando foi erigida em alvenaria, devolveu ao presbitério uma forma quase semelhante á que tivera por primeiro, reinstalou uma escultura da Santa Ceia no altar do Sacrário (local de onde tinha sido retirada e extraviada), reforçou os alicerces dos braços laterais da Igreja, refez o teto, as instalações elétricas e foi consumada com a troca dos bancos por outros novos e confortáveis.
A criação do Memorial da Paróquia de Nossa Senhora Sant’Ana se deu em quatro etapas: registro de objetos históricos que a paróquia ainda possuía, resgate de outros que foram extraviados, uma campanha de pedidos de doação de objetos históricos que os santanenses quisessem doar ao acervo do Memorial e a elaboração de um pequeno livreto contendo a biografia do Párocos de 1848 a 2007.
Assim, com um acervo de peças sacras que a Paróquia ainda possuía, com um relativo número de objetos sacros e litúrgicos devolvidos, com peças antigas doadas por famílias santanenses, com uma Maquete do Pavilhão e a galeria de fotos do Congresso Eucarístico de 1948 doadas ao Memorial pelo Senhor Francisco Evangelista Chaves, o mesmo foi aberto às primeiras visitações públicas em 17 de Julho de 2007.
Aquelas primeiras visitações foram marcadas pelo fazer memória de famílias inteiras que vinham visitar o espaço e reviviam com seus membros mais sábios fatos que ainda hoje têm repercussão em sua vida hodierna. Muitos foram os visitantes naquela ocasião que se emocionaram ao entrar em contato com peças que lhes recordavam sua meninice, sua juventude ou sua luta “para vencer na vida”.
Hoje, funcionando graças ao trabalho voluntário precioso da historiadora Ana Aurilane Cavalcante, do guia Antônio Florêncio da Costa Filho (Estudante de Tecnologia de Alimentos) e do Diretor Francisco Leandro Costa (enfermeiro por formação), O Memorial tem proporcionado a muitos alunos das escolas públicas da cidade, a visitantes que vêm a cidade na festa da Padroeira e aos filhos da cidade que moram em outras terras a oportunidade de outra opção de lazer, aprendizagem e construção de uma identidade.




A realização do terceiro círculo de estudos do Grupo de Pesquisa em História e Memória Social da Educação e Cultura – MEDUC ocorrido no dia 30 de abril de 2011 no Memorial da Paróquia de Nossa Senhora Santana foi, para nós um grande reencontro, um dia de feliz messe e uma ocasião de rever a caminhada para aperfeiçoa – la.
Neste círculo, professores dos cursos de Pedagogia, Ciências Sociais e História da UVA e do Instituto Federal de Ciência e Tecnologia de Sobral puderam conhecer o caminho que o Memorial percorreu, os frutos que já colheu, a sua proposta pedagógica “extramuros” e partilharam conosco gratas surpresas: o pedido da Mulher do Senhor Luís Júnior (Memorialista, professor, catequista e violeiro da cidade já falecido) para que colaboremos na criação de um Memorial dedicado ao mesmo, a declamação de um cordel em homenagem ao Senhor Luís Júnior por uma de suas ex alunas no momento da reunião e a entrega pela professora Ivna Holanda, de um retrato do professor Isaías Tomaz doado ao memorial por seu filho José Célio Fonteles Tomaz.


O caminho que temos que percorrer ainda é longo. Em nossa bagagem o primeiro item deve ser o da paciência histórica que sempre nos ensina que não devemos ter a pretensão de ser a “solução dos problemas”, mas nos colocarmos na postura de felizes operários.
Tal jornada é melhor ainda quando vamos com companheiros animados pelo mesmo ideal. Ao MEDUC, a Padre Agnaldo, aos memorialistas de minha terra, a Antônio Filho, Aurilane, Ivna Holanda, Francisco Guedes, Edvar Costa, Dona Maria do Senhor Luís Júnior, dona Rosa Eronides Pereira, aos doadores que colaboraram e colaboram com a construção do acervo do Memorial, a Marciélio Fonteles Vital (ex secretário de Cultura do Município e atual secretário de Educação), a Ana Delisier Sousa (atual secretária de cultura de Santana do Acaraú) e ao Grupo de Amigos do Memorial (GRAM) nossa grande gratidão.

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