sábado, 19 de novembro de 2011

149° de Santana

POR OCASIÃO DAS COMEMORAÇÕES DO 149º ANIVERSÁRIO DE EMANCIAPAÇÃO POLÍTICA DE SANTANA DO ACARAÚ, FOI CELEBRADA UMA MISSA NO DIA 3 DE NOVEMBRO, PRESIDIDA PELO PADRE RENATO WELTON F. BÔTO.
O MESMO PROFERIU UMA HOMILIA QUE CONSIDERAMOS PROFUNDA, NORTEADORA E NECESSÁRIA PARA SE PENSAR OS CAMINHOS DOS PRÓXIMOS ANOS DE EXISTÊNCIA DA CIDADE.
ATENDENDO O NOSSO PEDIDO ELE A TRANSCREVEU PARA NÓS E NOS PERMITIU AQUI PUBLICÁ-LA




O então povoado Santana do Olho d’Água logo após ter sido elevado à categoria de Vila por determinação da Lei nº 1.012 de 03 de novembro de 1862; tendo instalada em 27 de junho de 1863 a sua primeira legislatura, recebeu o título de Município com a Lei nº 1.740 de 30 de agosto de 1876, demoninado-se assim Santana.
Obviamente uma história assim tão antiga e rica é impossível de ser transmitida em poucas linhas e não é o caso de o fazermos, pois nos falta de um lado, seja a competência para tanto bem, como – um traço distinto neste momento, diria – a pertença quanto à origem a esta terra. Por isto mesmo nos detemos à parte e, de um modo simples, lançamos um pequeno olhar visionário à história de um berço de gente que hoje completa cento e quarenta e nove anos de existência. E para tanto gostaríamos de partir das origens. Não das origens desta terra, desta cidade, mas das origens do próprio conceito de cidade e, consequentemente, do povo que a compõem.
Bem se sabe que nossa ideia de cidade tem sua origem na concepção grega da assim chamada Polis, palavra da qual deriva Popolus, isto é, uma reunião, conjunto de pessoas. Polis, populus, persona, ou seja, pessoa; é esta a parte indivisível que encontramos na origem de uma cidade, de um povo, a pessoa. À esta pessoa – ou conjunto delas – se atribui o Múnus, as prerrogativas, o poder que nos leva consequentemente a uma outra palavra importante, Município, lugar onde os cidadãos exercem seus poderes e funções em prol do lugar onde vivem.
O grande filósofo grego, Aristóteles (384-322 a.C.) já afirmou em uma de suas obras que “o homem é um animal político por natureza”; ou seja, é próprio do caráter humano a capacidade de interagir uns com os outros criando meios e modos com os quais governa e estabelece uma relação com o meio onde vive. Vale lembrar, porém, que na cultura grega a participação da vida política da chamada polis era restrita e permitida somente a algumas categorias de pessoas, ficando excluídos, por exemplo, os escravos, mulheres, crianças, anciãos, etc. O mais importante a se saber é que no centro da chamada política encontrava-se o homem – mesmo que isso significasse apenas algumas categorias! O homem, a pessoa, era o centro dessa vida política e, em torno dela, a polis deveria estabelcer seus meios.
A democracia – outro legado da cultura grega – tem como base exatamente a participação de todos num processo ligado ao bem estar de cada um dos indivíduos da polis, da cidade. A elevação e a promoção da polis significava ao mesmo tempo a elevação e promoção do homem. A identificação de tal fato era tão real que muitos dos grandes pensadores da história tornaram-se imortais graças, também, ao nome dos lugares de onde provinham e que os identificavam diretamente com a sua terra: Tales de Mileto, Anaximandro de Mileto, Parmênides de Eléia, Eratóstenes de Cirenia, etc.
Já a concepção pós-moderna da polis, da cidade, possui básica e fundamentalmente três aspectos: econômico, ideológico e político. Com a chegada da modernidade e dos grandes meios de produção e geração de lucro, que se deu particularmente a partir da Revolução Industrial, o centro da história passou a ser o próprio capital e não mais o homem. Já não era mais o lucro em função do homem, mas o contrário e, tal descentralização, causou a alienação do próprio homem, pois a economia, o lucro, passou a ser a grande roda que faz girar o mundo.
A ideologia que marca o centro de cada poder econômico tornou-se a religião dominante, centrada não em Deus, mas nas próprias vantagens do sistema.
E, por fim, a política corrompeu-se deixando de lado a sua maior função, o bem estar do homem, para transformar-se numa engrenagem de métodos com os quais se deseja obter os bens almejados, manteve a distância de classes e continuou distanciando-se daquele que é o seu cuidado primeiro: o ser humano.
O resultado de todo esse processo nós o sentimos e vemos no nosso quotidiano, basta ligarmos a televisão. Trata-se de uma realidade que atinge todo lugar civilizado. E não é diferente na nossa realidade santanense. O homem, infelizmente, tem sido vítima sempre mais de um sistema que, uma vez nascido para ele, agora procura abortá-lo. É preciso haver um resgate.
Hoje celebramos não somente os cento e quarenta e nove anos de história política – e religiosa – de Santana do Acaraú. Celebramos hoje os cento e quarenta e nove anos de milhares e milhares de histórias, de milhares e milhares de pessoas que formaram e formam a história deste lugar. São eles indivíduos ilustres e anônimos, sobretudo anônimos. Ilustres como seus primeiros legisladores, políticos, deputados, prefeitos, vereadores, doutrores, padres – dos quais citamos simplesmente um, Pe. Antônio Tomás, o príncipe dos poetas cearenses. Não o citamos somente por ser um padre, mas porque – e acima de tudo, e talvez mesmo por isso – entendeu mais do que ninguém a matéria da qual o homem era formado, uma realidade terrena e divina. Dentre tantos outros nomes ilustres existem aqueles que destacam-se pelo ilustre anonimato. São eles tantos Josés, tantas Marias, tantos Antônios, tantas Antônias, Franciscos, Franciscas, Socorros, Anas, Joãos, etc., cada um, autor de sua própria história escondida dentro desses quase cento e cinquenta anos e quem sem dúvida preenchem os espaçoes brancos dos livros históricos que não registram seus nomes.
Dizer-se santanense é já professar o seu lugar, é já professar a sua fé e a sua identidade, pois esta mesma cidade, mais do que administrativamente fundada, cresceu e ganhou vida no seio de outra realidade que era presente nesta terra a bem mais de centro e quarenta e nove anos, isto é, a fé! Santana é filha da mais autêntica e original fé católica e por ela vidas foram sacrificadas. Por isso mesmo é salutar lembrar hoje na solenidade de tal recorrência civil que Santana traz em si, antes de tudo, não uma história política, mas religiosa, pois foi de uma simples capelinha dedicada à mãe da Mãe de Jesus que surgiu a cidade hoje celebrada. Ignorar este fato é ignorar a própria história. Não conhecer nossa origem histórica é já o princípio da extinção e da própria existência humana e o fim de todas as demais memórias.
No Evangelho que proclamamos (Jo 17) vimos a conhecida oração pela unidade proferida por Jesus. Nela emerge um profundo desejo do Cristo: que todos sejam um, como Ele e o Pai são um.
Pois bem, reconhecer-se membros de uma mesma realidade religiosa e civil é reconhecer-se numa unidade que nos acumuna: nossa terra, nosso chão, nossa cidade, nossa gente, nossas histórias.
Santana, como inúmeras outras cidades no nosso Brasil, do nosso Nordeste e do nosso Ceará, é vítima de tantas mazelas sociais e de tantas diferenças. Mas é preciso reconhecer também tantos méritos. Santana está dentre as maiores cidades brasileiras que mais possuem universitários, que mais formam médicos, professores e outros profissionais nas mais variadas areas. Possui uma lista imensa de nomes ilutres que desfilam nos mais variados setores da vida pública, mas é verdade também que talvez tanta história e tanta riqueza esteja se perdendo nos meandros da ignorância e do esquecimento e na falta do devido valor a que se deve atribuir tamanha riqueza.
Somos chamados hoje, celebrando uma data tão importante, a resgatarmos juntos todo um arsenal de capítulos dessa história que talvez há tanto tempo já se tenha esquecido. Somos chamados a resgatarmos a unidade do povo para constituir novamente uma identidade ainda mais forte, dinâmica e concreta a fim de que a cidade se reconheça em cada um de seus filhos e que em cada um de seus filhos a cidade seja reconhecida, superar diferenças e somar forças para nos reconhecermos todos membros de uma mesma origem. Porque lá onde estará um santanense estará a própria Santana. O homem é a sua terra, o seu berço, pois sempre quando se eleva o homem há também de elevar-se a sua terra, o seu chão, a sua casa.
Parabéns, Santana do Acaraú.

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